A Monument Street, que corta o centro de Pacific Palisades, em Los Angeles, na Califórnia, conta duas histórias drasticamente diferentes do incêndio que sufocou a comunidade e já deixou 24 mortos.
De um lado, terrenos onde ficavam casas no valor de vários milhões de dólares agora são cinzas e escombros. Do outro, um shopping a céu aberto cujos inquilinos incluem a Chanel, a loja de roupas masculinas Buck Mason e um restaurante de sushi sofisticado, está em grande parte intacto.
Uma música dos anos 1950 podia ser ouvida na sexta-feira (10) nos alto-falantes ao redor do shopping, o Palisades Village, mesmo com lojas fechadas. Grandes caminhões de água estavam de prontidão, prontos para a ação caso o fogo ameaçasse novamente os estabelecimentos comerciais.
Durante o auge dos incêndios, Rick Caruso, bilionário dono do Palisades Village, estava em reunião com sua equipe de segurança enquanto eles enviavam vários bombeiros particulares do Arizona para salvar o shopping. Segundo ele, os profissionais tentaram sem sucesso salvar casas próximas também.
Na quarta (8) de manhã, depois que os hidrantes da área secaram ou perderam pressão, o bilionário chamou caminhões particulares que carregavam água para ajudar.
“Nossa propriedade está de pé”, disse Caruso, que concorreu à prefeitura de Los Angeles em 2022 e perdeu para Karen Bass. “Tudo ao nosso redor se foi. É como uma zona de guerra.“
Lá Fora
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Os incêndios de Los Angeles destruíram mais de 12 mil estruturas. Nas comunidades mais devastadas, algumas que sobreviveram, como o Palisades Village, fazem uma contraposição chocante com as ruínas a poucos passos de distância.
Enquanto o fogo continua a queimar, autoridades e muitos habitantes de Los Angeles manifestam raiva, choque e frustração com a forma como os incêndios, sem precedentes, sobrecarregam os socorristas.
Uma questão central é se os departamentos de bombeiros da região poderiam ter recrutado bombeiros adicionais mais rapidamente e se tal mobilização teria impedido que os incêndios se espalhassem.
Mas alguns proprietários não confiaram nas agências públicas, recorrendo a bombeiros particulares como aqueles que ajudaram a salvar a propriedade de Caruso e que se tornaram um recurso cobiçado em algumas das comunidades mais ricas —e mais ameaçadas pelos incêndios— do sul da Califórnia.
O negócio de bombeiros particulares veio à tona em 2018, depois que o site TMZ relatou que Kim Kardashian e Kanye West haviam contratado esses profissionais para proteger sua mansão no bairro de Hidden Hills, em Los Angeles.
Algumas pessoas criticaram o casal na internet, dizendo que estavam usando sua vasta riqueza para minar o que deveria ser um serviço público, embora Kardashian tenha dito à época que sua equipe de bombeiros particulares também havia salvado as casas dos vizinhos de danos.
Na noite de terça, enquanto as chamas consumiam grande parte de Palisades, Keith Wasserman, cofundador de uma empresa de investimento imobiliário, enfrentou críticas semelhantes depois de recorrer à plataforma social X com um post desesperado. “Alguém tem acesso a bombeiros particulares para proteger nossa casa?” escreveu ele. “Precisamos agir rápido. Todas as casas dos vizinhos estão queimando. Pagarei qualquer valor.”
Uma equipe de bombeiros particulares com duas pessoas e um veículo pequeno pode custar US$ 3.000 (R$ 18 mil) por dia, enquanto a diária para 20 bombeiros em quatro caminhões pode chegar a US$ 10 mil (R$ 61 mil), de acordo com Bryan Wheelock, vice-presidente da Grayback Forestry, empresa de bombeiros particulares. Contratá-los não é tão simples: a maioria não trata diretamente com os proprietários.
Nos EUA, 45% dos bombeiros são privados, segundo Deborah Miley da National Wildfire Suppression Association. Eles atuam principalmente como contratados do governo em incêndios florestais, complementando bombeiros locais, e também por seguradoras para proteger residências contra incêndios.
Muitas vezes, o trabalho é feito antes que um incêndio florestal atinja uma propriedade. Isso envolve limpar a vegetação, pulverizar retardante de chamas e vedar as aberturas com fita à prova de fogo nos dias e horas antes da chegada das chamas.
“Nós tornamos a propriedade sobrevivível, para que o fogo possa passar por cima dela”, disse David Torgerson, fundador da Wildfire Defense Systems. A demanda por bombeiros privados tem aumentado à medida que os incêndios florestais têm se tornado mais frequentes ao longo das últimas décadas.
Em 2018, a Califórnia aprovou uma lei regulando a indústria de combate a incêndios, exigindo que bombeiros contratados coordenem suas ações com comandantes de agências públicas e proibindo o uso de insígnias, luzes ou sirenes de emergência. Após a lei, muitas empresas privadas cessaram serviços diretos a proprietários no estado.
O Mt. Adams Wildfire, um grupo privado de combate a incêndios, é um dos que saíram desse mercado. Don Holter, um dos proprietários, disse que se tornou muito difícil trabalhar diretamente com os proprietários. A empresa atua apenas por meio de contratos governamentais.
Brian Rice, presidente dos Bombeiros Profissionais da Califórnia, critica bombeiros privados em incêndios urbanos. Ele destaca que esses grupos são treinados para florestas densas, enquanto o combate atual em Los Angeles é urbano, exigindo operações de bairro em bairro, para as quais empresas privadas não estão preparadas.
Isso não parece estar diminuindo a demanda por eles.
noticia por : UOL