A reformulação da assistência externa dos Estados Unidos realizada por Donald Trump gerou caos na área de ajuda internacional e desenvolvimento, afetando centenas de empresas contratadas para prestarem serviços ao governo federal. Muitas já enfrentam crise financeira grave, com demissões e faturas milionárias não pagas.
Horas após assumir o cargo, em 20 de janeiro, Trump ordenou uma revisão abrangente de quase toda a ajuda externa dos EUA e encarregou Elon Musk de reduzir a Usaid —Agência dos EUA para o Desenvolvimento Internacional, que o bilionário acusou de ser uma organização criminosa, sem apresentar provas.
Seus comentários sucedem o afastamento de diversos funcionários da Usaid após estes se recusarem a conceder acesso a sistemas internos a funcionários do Doge (Departamento de Eficiência Governamental), órgão que o dono da Tesla, do X e da SpaceX chefia.
Desde então, dezenas de trabalhadores da Usaid foram colocados em licença e centenas de contratados internos demitidos, enquanto funcionários do Doge esvaziaram a agência que é o principal braço humanitário de Washington, fornecendo bilhões de dólares em ajuda em todo o mundo.
Ordens gerais de suspensão de trabalho emitidas pelo Departamento de Estado lançaram a indústria de ajuda no pânico, tanto no país quanto no exterior, já que os contratados normalmente adiantam os custos e depois recebem do governo dos EUA.
Na segunda (3), dezenas de funcionários da Usaid, contratados e legisladores democratas, protestaram do lado de fora dos escritórios da agência em Washington depois de terem sido informados que o prédio da sede seria fechado por um dia.
Lá Fora
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Em 2023, os EUA distribuíram US$ 72 bilhões (R$ 422 bilhões) em ajuda em todo o mundo, desde saúde das mulheres em zonas de conflito até acesso a água potável, tratamentos de HIV, segurança energética e trabalho anticorrupção. Eles forneceram 42% de toda a ajuda humanitária registrada pelas Nações Unidas em 2024.
Para Steve Schmida, um dos contratados da Usaid em áreas como inovação, conservação de pesca e comércio e investimento, a questão se tornou existencial após as ordens de suspensão de trabalho.
“Tínhamos milhões de dólares em faturas a serem pagas que haviam sido aprovadas por nossos clientes no governo dos EUA”, disse Schmida. “Entendemos rápido que isso era uma séria ameaça ao nosso negócio.”
A empresa demitiu e deu licença remunerada a dezenas de funcionários, prevendo a perda de 90% da receita. Apenas cerca de uma dúzia dos quase cem funcionários nos EUA talvez não seja afetada, segundo Schmida. “Os últimos dez dias foram os piores da minha vida profissional.” O financiamento para alguns de seus projetos foi concedido durante o primeiro governo Trump.
Muitos funcionários e contratados da Usaid expressaram choque com a rapidez com que o governo agiu para demitir pessoas e apenas alguns dias antes de seus benefícios e seguro de saúde expirarem.
Uma delas foi Rose Zulliger, que trabalhou pela Usaid em iniciativa sobre malária como assessora técnica sênior. Ela foi demitida na semana passada, e seus benefícios terminaram alguns dias depois. Ela teve de correr para encontrar um convênio médico antes do procedimento de remoção das amígdalas agendado para sua filha em três semanas.
“Não é apenas o estresse pessoal de que perdi meu emprego”, disse Rose. “É também a realidade de que a saúde global, como a conhecemos, e o trabalho que fazemos —salvando vidas e também protegendo os americanos— foi colocado em pausa, e a confiança e os relacionamentos que trabalhamos tão duro [para construir], que são tão integrais para a influência dos EUA na esfera global, foram todos rompidos.”
Esther Zeledon e seu marido, Paul Rivera, perderam 95% de sua renda devido aos decretos de Trump sobre assistência externa e diversidade. Ela trabalhava meio período e tinha outros contratos com a Usaid, enquanto ele era contratado em tempo integral. O casal considera mudar-se para a casa dos pais e retirar dinheiro da aposentadoria para cobrir despesas.
O financiamento da Usaid, que representa menos de 1% do orçamento total do país, é fundamental nos esforços de Washington para construir alianças ao redor do mundo, reforçar sua diplomacia e contrapor a influência de adversários como China e Rússia.
noticia por : UOL